Concerto para se jogar; Game para se ouvir*

Posted: February 27, 2015 in Matérias
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Espetáculo Muzikstation 64 utiliza orquestra jovem para apresentar um concerto com trilha de games

song of the storm

A, C pra baixo, C pra cima; A, C pra baixo, C pra cima. Os comandos no controle do videogame Nintendo 64 formam os acordes da ocarina para tocar Song of the Storm, uma música que ainda está na memória (e nos ouvidos) de muitos que jogaram The Legend of Zelda: Ocarina of Time, clássico de 1998 do console de 64 bits da Nintendo.

Nos próximos dias 27 e 28 de fevereiro e 1º de março, os fãs de jogos em Manaus poderão ouvir Song of the Storm em acordes não de ocarina, mas nos instrumentos de uma orquestra completa no Muzikstation 64, um concerto que vai levar para o Teatro Amazonas os temas de jogos famosos como Super Mario Bros, Final Fantasy e o próprio Zelda.

muzikstation64

O Muzikstation 64 (que, por sinal, tem esse nome em referência aos videogames PlayStation e Nintendo 64) será a primeira apresentação da série “Encontro das águas”, promovido pela Secretaria do Estado da Cultura (Sec) e é uma consequência do grande sucesso que o espetáculo “Música no Espaço”, com a trilha de Star Wars, teve ano passado.

“Recebíamos muitos e-mails e pediam de tudo: Jurassic Park, Harry Potter e Indiana Jones”, fala o maestro Marcelo de Jesus, que comanda a regência dos espetáculos. Ele também diz que a música de jogos veio para absorver ainda mais esse público criado após o Música no Espaço. “(A série) foi criada para fomentar e atrair outro tipo de público, que talvez gostaria de vir ao teatro para assistir esse tipo de espetáculo”, diz.

Para combinar com o clima dos jogos eletrônicos, que chama um público mais jovem, o Muzikstation 64 vai ter o diferencial de ser composta pela Orquestra Experimental da Amazonas Filarmônica, que é formada por estudantes de música do Liceu de Artes e Ofícios Cláudio Santoro, além de dois grupos de corais: o Grupo Vocal dos Corpos Artísticos e o Madrigal Ivete Ibiapina.

Todos eles não são formados por músicos profissionais, mas não significa que o espetáculo terá menos qualidade. “Os jovens de lá estão adquirindo experiência. Eles estão fazendo o trabalho de um profissional, mas ainda amparado pelos professores, tutores e maestros”, fala Marcelo de Jesus, que também enfatiza o foco pedagógico e acadêmico da iniciativa.

A prova desse empenho pode ser visto na preparação para o Muzikstation. Diferente de uma apresentação com uma orquestra profissional – que precisa, no máximo, de cinco ensaios – com a orquestra experimental os trabalhos começaram no início de janeiro, mais de um mês antes das apresentações.

“A gente fez uma semana intensiva para ler todos os arranjos. Agora eles têm dois ensaios de ‘naipe’ por semana, ou seja, cada conjunto de instrumentos da orquestra ensaia separadamente”, fala o maestro. “Aí, no sábado, a gente junta todo mundo e faz esse ensaio mais geral”, completa.

Seleção de fases

Do Atari, no final dos anos 1970, até os mais recentes PlayStation 4 e Xbox One, são milhares de jogos e, consequentemente, de trilhas para escolher para as apresentações. O maestro Marcelo de Jesus fala que o set list de músicas foi montado a partir de pesquisas informais feitas com jogadores de Manaus para saber quais as trilhas de jogos preferidas. “Depois disso, que demorou um tempo, ficamos com uma lista de 15 a 20 jogos”, fala.

No final, o Muzikstation terá músicas de seis séries de jogos: Super Mario Bros, The Legend of Zelda, Halo, The Elder Scrolls (Skyrim), Shadow of The Colossus e Final Fantasy.

Para cada uma delas, os maestros e arranjadores trabalharam de modo diferente para adaptá-las para uma orquestra. “O que fizemos foi, no caso de umas, fazer uma transcrição exatamente como está no jogo”, fala. “Já outros, por exemplo o Mario Bros, em que você não tem uma trilha e sim os efeitos sonoros que a gente conhece, então nós fizemos como um medley com os temas, só que pensando na orquestra”.

Um exemplo de trilha que será idêntica no jogo e na apresentação é a da série Halo, um dos maiores sucessos da plataforma Xbox (da Microsoft). A arranjo de Halo foi feito pelo também maestro Otávio Simões. “Eu fiz uma transcrição exata da trilha, sem mudar ou acrescentar coisas, ainda assim deu bastante trabalho”, fala.

Simões confessa que nunca jogou nenhum jogo da série. “Até porque nunca joguei Xbox , eu parei no Super Nintendo”, mas a trilha conseguiu despertar mais uma vez o lado jogador no maestro e ele diz que ficou bem interessado nos jogos. “Fiquei bem animado e curioso em saber se os arranjos são as cenas que eu estou imaginando”, diz. No Muzikstation 64 serão tocados a música tema da série e três músicas de Halo 3, jogo lançado para Xbox 360 em 2007.

Música em bit

Para quem não estar tão por dentro do mundo dos jogos eletrônicos, um concerto com trilha de jogos pode parecer estranho. O maestro Marcelo de Jesus fala que algumas pessoas podem até encará-las com certo preconceito, mas ele defende a qualidade das músicas de games. “A música não é só tim, tum, tom, pin, pon (sons eletrônicos). Não, não é. Ela realmente foi pensada pra ter uma trilha e isso é trabalho de compositor”, comenta. “A única diferença é que algumas são para orquestra e outras são pra instrumentos eletrônicos”, fala.

Assim, as músicas, mesmo de jogos mais antigos, que só usavam sons sintetizados, são facilmente reconhecíveis com uma roupagem de orquestra.

Entre compositores famosos nessa área estão principalmente japoneses, como Koji Kondo (Mario/Zelda) e Nobuo Uematsu, mas no ocidente há também nomes como David Wise (Donkey Kong Country) e mais recentemente o músico Darren Korb ganha destaque por seu trabalho nos jogos indies Bastion e Transistor.

Video Games Lives

Se o Muzikstation 64 trará para a Manaus o espetáculo inédito com trilha de jogos, eventos do tipo já são comuns em outros países. O maior e mais famoso deles é o Video Games Live (VGL), uma série de concertos que, desde 2002, roda o mundo com uma série de concertos.

As apresentação da VGL, inclusive, fazem muito sucesso no Brasil. No país, ela acontece todos os anos desde 2005 e já passou por diversas capitais, mas nunca em Manaus.

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Muito mais que um concerto sinfônico, o VGL é mais um show que une orquestra, bandas de rock e até DJ. Tudo abordando vários temas de jogos. Essa, porém, não é o intuito do Muzikstation 64. “O video Games Live é para as pessoas entrarem no mundo do game, mas a nossa proposta não é ser um concerto de videogame, nosso intuito é entrar no mundo da música sinfónica, que também pode fazer música de videogame”, explica o maestro Marcelo de Jesus.

Mesmo com propostas diferentes, não significa que a organização não está preparando surpresas para os fãs de jogos, assim como aconteceu com as apresentação do ‘Música no Espaço”, que contou até com Darth Vader no palco. “Ainda não sabemos o que vai ter de surpresas, mas vai ser nesse espírito do ‘Música no Espaço’”.

Uma coisa, pelo menos, é quase certa: os fãs certamente irão de cosplay e muitos Marios, Zeldas e Links deverão lotar o Teatro Amazonas.

Set list:

Koji Kondo
Overture: Temas de Super Mario Bros. (arr. Hilo Carriel)

The Legend of Zelda (arr. Guilherme Mannis)
i. Overworld
ii. Lullaby
iii. Saria’s Song
iv. Stone Tower Temple
v. Song of Storms

Jeremy Soule
The Elder Scrolls – Skyrim (arr. Cláudio Abrantes)
i. Tema
ii. Around the Fire

Kow Otani
Shadow of the Colossus (arr. Cláudio Abrantes)
i. Opened Way
ii. In the Land of Hapinness

Martin O’Donnell / Michael Salvatori
Halo Suite (arr. Otávio Simões)
i. Theme
ii. Last of the Brave
iii. Behold a Pale Horse
iv. One Final Effort

Nobuo Uematsu
Final Fantasy (arr. Guilherme Mannis)
i. The place I’ll return someday
ii. To Zanarkand
iii. One Winged Angel

*Texto original que foi adaptado na matéria do Jornal Amazonas Em Tempo de 27 de fevereiro de 2015 e pode ser lida neste link

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